A 15ª edição da Sesmaria da Poesia Gaúcha de Osório, festival de poesia realizado na noite do dia 25 de setembro, na Câmara de Vereadores daquele município, reservou uma feliz surpresa para Piratini: o menino de 14 anos de idade, JOÃO FRANCISCO PINHEIRO NETO, filho de JESUS PEIXOTO PINHEIRO e de EVA ELOÁ DE SOUZA PINHEIRO, família residente na Primeira Capital Farroupilha, conquistou o troféu e a quantia de oitocentos reais correspondentes ao 1º lugar como Intérprete do poema “Guri da Gaita” de autoria do poeta piratiniense JUAREZ MACHADO DE FARIAS que amadrinhou a declamação executando uma gaita-de-boca.
A situação é inédita no meio nativista pois os eventos do gênero contam com os mais laureados declamadores a exemplo de PATROCÍNIO VAZ ÁVILA, DELCI OLIVEIRA e XIRU ANTUNES que concorreram, na oportunidade, com JOÃO FRANCISCO, o que dá mais sabor à vitória pelo grande significado dos competidores. Assim, num evento de experientes e veteranos artistas, um menino de catorze anos ganhou a principal premiação.
O corpo de jurados foi composto por PAULO RICARDO DOS SANTOS, JOSÉ CARLOS BATISTA DE DEUS e VAINE DARDE, três artistas renomados que transitam pelo circuito dos festivais nativistas e que tiveram a coragem de destacar em primeiro lugar em declamação um menino que realizou sua estreia num concurso consagrado como é a Sesmaria da Poesia Gaúcha.
JOÃO FRANCISCO PINHEIRO NETO é aluno do 1º ano do Ensino Médio do Instituto Estadual de Educação Ponche Verde e teve seu talento de ator e declamador descoberto pela Professora MARIA ENILDA ROSÁRIO DOS SANTOS LEITE quando esta criou, em 2006, um grupo artístico na Escola Municipal Agropecuária Alaôr Tarouco e que tem realizado inúmeras apresentações públicas, sempre elogiadas pelos espectadores.
O Poeta JUAREZ, ao assistir uma apresentação do menino, ficou impressionado com o seu poder interpretativo e não teve dúvidas de convidá-lo para declamar o poema "Guri da Gaita" que julgou apropriado pois o texto fala de um fato real da vida do autor, quando este ganhou uma gaita-de-boca de seu pai.
JUAREZ e JOÃO FRANCISCO viajaram até Osório em companhia do Poeta e Declamador DELCI OLIVEIRA que venceu o festival com o poema de TADEU MARTINS, intitulado “Ex-Carreta”, amadrinhado por ÍGOR MARTINS (violão) e RODRIGO MENEZES (teclado).
A vitória do menino JOÃO FRANCISCO em tão importante certame se deve, também, às orientações de DELCI OLIVEIRA que, durante o trajeto de Piratini a Osório, fez observações relevantes ao estreante como a entonação da voz, a compreensão do texto poético e a postura, já que o referido artista tem uma larga história de premiações em festivais de declamação e, inclusive, realizou oficina de técnicas de interpretação de poesia na Semana Farroupilha de Piratini, neste ano.
De volta a Piratini, no dia 26, domingo, Juarez e João Francisco, mais uma vez conduzidos por Delci Oliveira, ao adentrarem na cidade fizeram questão de visitar, em primeiro lugar, a Professora MARIA ENILDA para lhe comunicar a conquista do título, em sinal de profunda gratidão por seu trabalho artístico que foi capaz de descobrir o talento de um menino para a declamação.
O momento foi marcado por muita emoção, especialmente, pela educadora que recebeu das mãos dos dois o livro onde constam os onze poemas classificados para o festival, com dedicatórias autografadas pelo autor e declamador.
Abaixo, o poema que foi gravado ao vivo juntamente com os demais concorrentes e será comercializado em CD e DVD a serem lançados pela associação cultural que coordena o festival:
O GURI DA GAITA
A minha infância residiu
Na costa do arroio,
Na costa do rio.
Meu arroio Barrocão
Se derramava em canção
Pra morrer no Camaquã...
Cada grito de tajã
Meu ouvido de guri
Escutava cada som:
água, vento, bem-te-vi...
Calhandras, quantas calhandras
Beliscavam nos varais,
E copiavam outros cantos
Dos ninhos nos matagais.
O rádio grande da sala
Trazia os sons da cidade;
E os programas regionais
Esta musicalidade
Que se traduz em violão,
Cordeonitas de botão,
Trova e declamação,
Sentimentos de saudade...
Eu só queria uma gaita,
Uma gaitinha-de-boca,
Pra tocar uma valsinha,
Com aquela vozinha rouca.
Que aquele som cativasse
Cada ouvido em que chegasse.
E que alguém, num jeito taita,
Por graça, me apelidasse
Só assim: “Guri da Gaita”.
Quando a gaitinha chegou
Enrolada e misteriosa
No mais soturno do bolso
Da bombacha do meu pai,
Eu abri o maior sorriso,
Que outro igual não me sai.
E de vereda colei
Meus lábios aos lábios dela,
Feito um príncipe que beija,
Com amor, sua donzela.
Fui tirando uma marquinha,
Treinando a respiração,
E nuns três ou quatro dias
Tocava até vaneirão.
Mas meu pai, num outro dia,
Me trouxe um acordeon
De oitenta baixos e disse:
“Isto pra ti é que é bom!”
“Gaita-de-boca é pra louco
Que esmola em rodoviária!”
E eu guardei minha gaitinha
Com sua voz solitária...
Mudei-me – como faz tempo! –,
Deixei o arroio e o rio.
Mas não mudei minha alma,
Muito menos meu feitio.
Quem me olhar bem nos meus olhos,
Enxergará lá no fundo,
Aquele “Guri da Gaita”
Que só pedia pro mundo
Uma gaitinha-de-boca
- “Pode ser piquinininha” –
Que tocasse com voz rouca
Ao menos uma valsinha...
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Matéria: Juarez Machado de Farias